Luiz Antônio Viana

Textos e reflexões sobre sociedade, cultura e arte

Textos

A Geni dos tempos modernos

Quem não passou pela desagradável experiência de ouvir de uma indiferente e fleumática atendente de banco, funcionária de companhia de aviação ou caixa de supermercado, a fatídica frase "...o sistema caiu", ou, "...a culpa é do sistema"? Pior ainda é a desculpa dos burocratas alérgicos a mudanças inovadoras em seus procedimentos inflexíveis: "...o sistema não permite".

Sistema. Palavra terrível. Já significou tudo aquilo contra o que se devia lutar. Hippies, estudantes e membros do PCI, cerravam fileiras contra o pérfido e malévolo establishment. O PCI, aliás, ao contrário do que vocês podem pensar, não é o antigo partidão italiano, mas sim o ainda atuante Partido Comunista de Ipanema, uma agremiação organizada em torno de generosos copos de chope, onde a juventude dourada do Rio de Janeiro se reunia para resolver com eloqüência os problemas do Brasil e do mundo e, naturalmente, apreciar as coisas mais lindas que víamos passar.

Neste caso, no entanto, não é daquele sistema que quero falar mas sim do grande herói e vilão dos tempos modernos, o culpado de tudo que dá certo e errado no nosso mundo altamente informatizado: o computador.

Lembram da música do Chico, aquela do "...joga a pedra na Geni", etc., etc.? Pois os sistemas informatizados são como a Geni da música. Nós os usamos como bodes expiatórios de todo tipo de incompetência e de comodismo, embora estejamos umbilicalmente ligados à sua existência.

Ainda hoje, poucas são as organizações que conseguem fazer seu pessoal de contato com o público entender que o problema não é do sistema e muito menos do cliente. É um problema deles. Como será resolvido e se será resolvido é uma questão que tem que ser examinada caso a caso. Muitas vezes não há mesmo solução e o bom treinamento e a simpatia dos atendentes vão, na melhor das hipóteses, minorar a insatisfação do cliente prejudicado ou mal atendido.

O que não é aceitável, no entanto, é a olímpica indiferença com que a maioria das empresas de serviço encara a questão. Na realidade, grande parte dos problemas ocorridos no atendimento a clientes poderia ser evitada com equipamentos mais potentes e/ou sistemas de back-up adequados. Em outras palavras: com os investimentos necessários.

A chave da questão é que muitas empresas ainda não entenderam que a economia na área de atendimento ao cliente é uma das mais porcas que se pode fazer. Economizam em pessoal, em treinamento, em linhas telefônicas e, last but not least, no... sistema! Sem pudor, esbanjam muitas vezes em outras áreas menos prioritárias um dinheiro que poderia ser mais bem gasto tratando melhor os seus clientes na hora em que eles têm algum problema.

Mas... cuidado! A paciência do cliente ou do consumidor tem limites e ele pune o mau atendimento com a mais poderosa arma disponível no mercado: o abandono. E existem algumas pesquisas que mostram que, em cada 25 clientes que abandonam seu banco, supermercado ou companhia de cartões de crédito em razão de maus serviços recebidos, apenas um volta a ser cliente, não importa o que aconteça depois. E perder clientes no mundo de hoje é como uma árvore perder sua seiva vital.

Depois não adianta pôr a culpa na Geni...

 
Artigo originalmente publicado em Valor Econômico, 01/08/2000

Conteúdo

Artigos publicados na imprensa do Rio de Janeiro e São Paulo, no Valor Econômico, O Globo, Jornal do Brasil, O Estado de São Paulo e Jormal do Commercio, e nas revistas Exame e Bravo, dentre outras.

 

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