Luiz Antônio Viana

Textos e reflexões sobre sociedade, cultura e arte

Textos

O exemplo do banheiro do avião

Cena real, recentemente vivida e muitas vezes vivida. Quase cena de filme catástrofe. Avião voando para Paris. Todos dormindo. Aproxima-se a hora da chegada. As luzes se acendem. Todos se espreguiçam, retiram os cobertores, colocam óculos, dão-se bom-dia. Tão certo quanto o sol nasce, as pessoas querem ir ao banheiro. Tal qual a largada de Le Mans, os necessitados passageiros se posicionam para alcançar seu nirvana fisiológico. E de repente, Vinícius que me perdoe, não mais que de repente, ela, a inexorável, a inevitável, a implacável, chega primeiro. Ela, a senhora elegante e bem arrumada de terninho e tendo às mãos seu instrumento de tortura, a nécessaire.

E aí, meus amigos e gentis leitores, e aí o inferno acontece. Não sei o que esse personagem tão típico faz nos banheiros de avião. Mas, seja o que for, o faz por um longo tempo. Quinze, vinte, quarenta minutos! E não é figura de retórica, já vi levar quarenta minutos. As pessoas mexem na porta, o que não adianta nada pois a senhora olimpicamente ignora os quase gemidos de seus angustiados companheiros de viagem. E se instaura a democracia da aflição. Em que classe for, primeira, executiva, econômica, todos sofrem. Executivos, presidentes, diretores, ministros, artistas, modelos. Todos são igualados na sua impaciência e na unânime condenação daquele ser odioso trancado atrás daquela porta escrita occupied.

Bom, não estou aqui para falar só de banheiros de avião. Estou aqui para falar de um exemplo típico de gargalo na prestação de um serviço. Será que alguém já pensou num avião com mais banheiros? Será que alguém já pensou em ter banheiros masculinos e femininos separados? Sei lá eu, será que alguém já pensou num temporizador que fará soar um aviso dentro do banheiro após certo tempo? Ou uma voz que diga "...o senhor está ocupando o banheiro por muito tempo"? Ou pelo menos, será que alguém já pensou em colocar um AVISO em letras vermelhas dizendo que o banheiro é de todos?

Enfim, eu quero falar é de marketing da diferenciação. Em oferecer ao cliente aquilo que os outros não oferecem. Em oferecer mais e eventualmente até cobrar mais por isso. Segmentar e satisfazer.

Supermercados com um maior número de caixas rápidos. Cinemas com lugares marcados. Concessionárias de automóvel que buscam seu carro em casa. Serviços de delivery que arrumam as coisas na sua prateleira. Hotéis que vão buscar você em casa. Táxis com TV ou música clássica. Médicos com hora rigorosamente marcada. Restaurantes que façam a sua dieta semanal. Cada pequena coisa em que uma empresa ou um serviço possa ser diferente fará dele uma empresa ou um fornecedor preferencial.

Em alguns mercados mais desenvolvidos isso já se aproxima da realidade. No Brasil mal engatinhamos. O espaço está aberto para muitos, para todos. Os competentes terão uma enorme margem de ganho.

 
Artigo originalmente publicado em Valor Econômico, 13/06/2000

Conteúdo

Artigos publicados na imprensa do Rio de Janeiro e São Paulo, no Valor Econômico, O Globo, Jornal do Brasil, O Estado de São Paulo e Jormal do Commercio, e nas revistas Exame e Bravo, dentre outras.

 

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