Luiz Antônio Viana

Textos e reflexões sobre sociedade, cultura e arte

Textos

Vera è morta, il mondo è meno vero

Vera Giangrandi se foi. Decidida e direta até na hora de ir. She died with her boots on. Morreu em combate, no Aeroporto, indo para Porto Alegre onde faria mais uma de suas brilhantes palestras de ombudsman, a ombudsman.

Seu coração parou de repente. Coração valente, velho de guerra, coração muito usado. Porque Vera amou. Amou homens alguns, privilegiados de um lado por tê-la tido, incompetentes talvez para tê-la no todo e no sempre. Amou intensamente seu trabalho e nele foi a melhor entre as melhores. Amou seus semelhantes menos ajudados pela vida de forma concreta e honesta.

Vera amou Abílio, Ana, João Paulo e a mim, nos tempos lindos da ressurreição do Pão de Açúcar. E amou tantos outros bravos colegas e lutou conosco uma luta difícil e bela. E amava do mesmo jeito que sabia desprezar, desprezar os mentirosos, os acomodados, os pusilânimes. Vera era isso, Vera, a Verdadeira, pleonasticamente Verdadeira.

E era alegre nos almoços descontraídos do restaurante em frente. Com seus cigarros coloridos que merecidamente chamávamos de cigarros de bordel. Elegante e discreta ao vestir, direta e sem rodeios ao falar.

Já viram uma galinha defendendo seus pintinhos? Essa era a Vera, defendendo seus pintinhos, os clientes. Milhões de pintinhos, milhões de clientes. E os defendia com a franqueza e a veemência que eram dela. Contra quem quer que fosse, custasse o que custasse.

Deve haver uma lógica para Vera ter ido tão cedo. Eu até hoje não entendi bem qual é. Uma grande perda para o Pão de Açúcar. Uma grande perda para nossa coletividade. Uma grande perda para a espécie humana. E, me perdoem ser tão pessoal, uma enorme perda para mim. Perdi uma irmã, uma confidente, uma amiga das minhas horas mais difíceis.

Sei que você volta, Veruska. Nossas crenças dizem que sim. Sei que você volta um dia, pra de novo fazer este mundo um pouco melhor, um pouco mais verdadeiro.

Sei que você volta, minha irmã, mesmo que a gente não saiba como e onde. Choro muito, agora me sinto mais só. Mas a gente se encontra de novo. Here, there, anywhere...

 
Artigo originalmente publicado em Valor Econômico, 24/08/2000

Conteúdo

Artigos publicados na imprensa do Rio de Janeiro e São Paulo, no Valor Econômico, O Globo, Jornal do Brasil, O Estado de São Paulo e Jormal do Commercio, e nas revistas Exame e Bravo, dentre outras.

 

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