Luiz Antônio Viana

Textos e reflexões sobre sociedade, cultura e arte

Textos

Como diria o velho e bom Bob Dylan

Uma empresa cujo pessoal a ela se refere como "eles" (e não como "nós") está muito doente, fadada ao fracasso. Levou tempo para esse conceito ser aprendido por alguns empresários e parece que vai levar toda a eternidade para outros tantos.

E qual é o segredo maior dessa conquista dos corações e mentes da comunidade de uma empresa? Ou seja, qual deve ser o foco de um adequado marketing interno? Por falar em segredos, um inglês, Swope, disse algo muito atual: "...o segredo do sucesso não sei, mas o segredo do fracasso é querer agradar a todos".

Um primeiro aspecto fundamental: países, times de futebol e empresas precisam se sentir vencedores, caso contrário serão perdedores mesmo; só se vence quando se ousa. A postergação ao encarar problemas cruciais, hábito bastante comum em algumas instituições, é algo como entrar em campo precisando do empate e deixar o adversário atacar o tempo todo: em 90% dos casos perde-se o jogo.

Além disso, muitas empresas são, em diversos procedimentos, piores socialmente do que a sua consciência permite enxergar e melhores em alguns outros que não são percebidas pelo seu público interno. Saber a real dimensão das coisas ajudará muito o seu amadurecimento institucional.

Mas eu quero falar aqui de um outro ingrediente essencial.

Sir Arthur Conan Doyle se tornou conhecido como o criador de Sherlock Holmes. Mas escreveu também atraentes contos de guerra, com grande intimidade, uma vez que foi médico do Exército Britânico. Num desses contos, um grupo de irlandeses integrava um batalhão inglês em combate com os dervixes. De repente, seu líder mais radical pergunta aos outros:


— "Por que lutamos? Pela Rainha que nos coloniza? Larguemos as armas e que se dane o maldito Exército Inglês!"

O sangue sobe à cabeça e os irlandeses abandonam as armas. O caos se instala. Até que outro irlandês percebe que aquela atitude significaria o fim de todos. Tira do dólmã um pano verde, símbolo da Irlanda, e o agita, perguntando:

— "Rapazes, lutarão vocês por isto? Que farão vocês pela bandeira?"

Respondem todos:

— "Nossa vida por ela!"

Os irlandeses combatem então como feras. Recompõem a formação permitindo que o batalhão se refaça. Morrem todos. O conto termina com o despacho do comandante dervixe ao seu superior:

— "Tudo parecia a nosso favor até que um dos infiéis ergueu uma bandeira, senhor, com as cores da verdadeira fé! E um grupo deles por ela deu sua vida. Conseguimos capturar a bandeira, que deve ser muito preciosa, porque infiéis morreram por ela!"

Médicos e religiosos em áreas inóspitas. Ativistas da ecologia. Árabes, judeus, palestinos, bascos. O Exército da Salvação numa noite fria. Londres funcionando normalmente sob bombas alemãs. Os soldados do conto de Conan Doyle. O que eles têm em comum? Ou, em uma outra perspectiva, o que eles têm em comum com o torcedor que chora a derrota do seu time numa noite fria? Ou com a maravilhosa torcida do Fluminense lotando os estádios na disputa da Terceira Divisão?

Eles têm em comum uma CAUSA por que lutar, viver, sonhar. Pessoas precisam de causas, povos precisam, empresas precisam. Uma causa. Hitler criou uma para os alemães humilhados. Churchill injetou uma nos ingleses acuados. Ghandi tinha uma. Fidel também.

E na vossa empresa? Qual é a vossa causa? Primeiramente, é preciso que se entenda que causas não podem ser resumidas só no lucro ou no aumento das vendas. Isso, a longo prazo, é pouco para criar um amálgama entre seres humanos que os faça combater o bom combate, vestir realmente a camisa.

As causas estão aí, no ambiente de uma empresa, abundantes, importantes, urgentes. E não devem ser usadas como bandeiras políticas ou discursos vazios. Devem ser o objetivo comum, a fé coletiva, o elemento aglutinador.

Qualidade. Responsabilidade social. Atendimento. Prazer no trabalho. Orgulho coletivo. Identidade empresarial. E tantas outras coisas e causas gerais e específicas. Qual deve ser a vossa escolha? The answer, my friend, is blowing in the wind...

 
Artigo originalmente publicado em Valor Econômico, 19/12/2000

Conteúdo

Artigos publicados na imprensa do Rio de Janeiro e São Paulo, no Valor Econômico, O Globo, Jornal do Brasil, O Estado de São Paulo e Jormal do Commercio, e nas revistas Exame e Bravo, dentre outras.

 

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